Por Josias Soares
Andando pelas ruas de Ciudad Del Este, no Paraguai, é impossível não notar a presença dos cambistas, aquelas figuras com bolsas repletas de dinheiro, à plena luz do dia, despreocupados com a própria segurança.
Com eles é possível trocar quaisquer quantias de uma moeda por outra – Dólar, Guarani, Real, em minutos. As taxas são um pouco acima das oficiais, e verdade, mas têm o benefício de não se exigir nenhuma identificação de parte a parte.
É o câmbio negro, na sua forma mais pura!
Coisa parecida só se vê com as criptomoedas (que, aliás, de moeda não tem nada). Sem o dinheiro (moeda), como o conhecemos, as criptomoedas não existem porque não será possível comprá-las ou vende-las.
Se não são moedas per si, o que são as criptomoedas? É meio de troca, tão somente.
E por que se tornaram tão atrativas?
Antes, uma analogia: já ouviu falar na deepweb? Pois é, não funciona tão bem quanto a surface web. Ainda assim, há os que preferem navegar pela deepweb. Por que? Porque as comunicações ocorrem de forma horizontal (point-to-point) e assim não são rastreadas, interceptadas ou impedidas.
A mesma lógica se aplica às criptomoedas.
No Sistema Financeiro oficial toda movimentação de moeda é controlada, ao passo que o ecossistema das criptomoedas – com suas blockchain, criptografias, token’s etc – consegue existir e atuar fora do controle do Estado.
Ideologicamente, há os que digam que as criptomoedas representam a libertação do homem do controle do Estado.
Porém, as preocupações giram em torno das possibilidades da utilização das criptomoedas para fins ilícitos que vão desde a lavagem de dinheiro ao financiamento de organizações terroristas internacionais.
Analisando algumas das características das criptomoedas, vê-se inúmeros motivos para preocupação: são facilmente cambiáveis (troca-se qualquer moeda oficial por criptomoedas numa Exchange, e vice-versa); não são (facilmente) rastreáveis dentro do ecossistema (nomes são trocados por códigos, como na deepweb); são de fácil remessa para o exterior (é possível comprá-las num País e vendê-las Noutro, e vice-versa, num click e sem nenhum controle Estatal; inclusive, são capazes de driblar embargos econômicos).
É esse conjunto de atributos que atrai o interesse das pessoas. Algumas são motivadas pelo potencial de valorização, outras para fins ilícitos – uma forte evidência disso são as cifras negras, ou seja, apesar do número crescente de golpes com criptomoedas são poucas as pessoas que acionam o sistema penal para investigar, talvez pelo receio de ter que explicar a origem do dinheiro que foi parar em criptomoedas.
É evidente que esse fenômeno vem provocando reações do Estados, que não devem abrir mão do controle sobre a moeda sob pena de malferir a própria soberania.
Algumas medidas parecem viáveis, outras são dúbias.
A iniciativa de criar uma criptomoeda oficial chega a ser risível. A um porque a moeda oficial já é virtual, afinal, o dinheiro não passa de um número contábil. A dois porque o valor das criptomoedas só existe na clandestinidade, ou seja, fora do controle Estatal, e essa “marginalização do sistema financeiro” interessa tanto quanto o câmbio negro nas ruas do Paraguai.
A regulação do mercado de criptomoedas parece ser a melhor solução (senão a única), controlando as operações junto às Exchanges – ponto de contato entre o ecossistema das criptomoedas e o sistema financeiro oficial dos Estados, por onde tudo passa.
Nota-se, no plano internacional, crescente movimentação para o controle da movimentação de capitais afim de prevenir e reprimir a lavagem de dinheiro, para assim sufocar as práticas e/ou organizações ilícitas, obrigando, inclusive, os particulares a colaborarem nesse processo, como decorre dos sistemas de compliance.
Aliás, finalizando, os sistemas de compliance deverão se debruçar sobre as criptomoedas, e aqueles, por sua vez, hão de coabitar no ecossistema dessas, cedo ou tarde.
Josias Soares, advogado, palestrante e professor.
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