Por Bibiana Fontella[1] e Gabriela Kreusch Serena[2]

 

Em janeiro de 2020 entrou em vigor a Lei n. 13.964/2019, popularmente conhecida como lei anticrime, a qual alterou vários dispositivos do Código Penal, Código de Processo Penal e Leis Penais Especiais.

Quando da tramitação do projeto anticrime, divulgação da ideia de que seria uma lei que reformaria o sistema penal brasileiro e traria como consequência a repressão criminal como uma das suas características essenciais. Contudo, várias das propostas do então Ministro da Justiça Sergio Moro deixaram de ser aprovadas, assim, em alguns pontos, a lei deixou de ter o caráter repressivo e assumiu a postura garantista da lei penal. Entretanto, em outros aspectos Lei Anticrime aderiu o clamor popular e endureceu vários dispositivos penais.

Um dos pontos de grande relevância da Lei Anticrime foi a inclusão do art. 3º-B e seguintes no Código de Processo Penal, instituindo o tão esperado juiz de garantias. Contudo, tais dispositivos foram objeto de Ação Direta de Inconstitucionalidade (n. 6298, 6299, 6300 e 6305), tendo tido vigência da lei suspensa por decisão do então Vice-Presidente do STF, Ministro Luiz Fux, por prazo indeterminado. Também, foi objeto de Ação Direta de Inconstitucionalidade o teor do art. 28, caput, do Código de Processo Penal, com alteração da Lei n. 13.964/2019. No qual o arquivamento de inquérito policial seguiria novas tramitação: a vítima, o investigado e a autoridade policial seriam comunicados e os autos encaminhados para a instância de revisão ministerial para fins de homologação.  Da mesma forma, este dispositivo legal teve sua vigência suspensa pela decisão do então Vice-Presidente do STF, Ministro Luiz Fux. Todavia, até o presente ambos os dispositivos permanecem com eficácia suspensa.

Entretanto, aqui analisa-se apenas as alterações promovidas pela Lei Anticrime no instituto da Prisão Preventiva, bem como a interpretação jurisprudencial:

A prisão preventiva – que é um dos temas mais sensíveis no cenário brasileiro – foi objeto de alterações pelo Lei n. 13.964/2019, fazendo consta no art. 315 do CPP a necessidade de fundamentação do decreto, substituição, negação da prisão preventiva, inclusão de indicação, na decisão, de existência de fatos novos ou contemporâneos que justifiquem a aplicação da medida adotada.

O §2º do referido artigo traz os requisitos para exclusão de fundamentação das decisões que versem sobre a prisão preventiva: i) limitar-se à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida; ii) empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso; iii) invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão; iv) não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador; v) limitar-se a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos; vi) deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.

No tocante ao requisito da contemporaneidade nas medidas cautelares pessoais, o Superior Tribunal de Justiça entendeu no julgamento do Habeas Corpus n. 553310[3], de relatoria da Ministra Laurita Vaz, pela ofensa do princípio da contemporaneidade em razão do decurso de longo perigo de tempo entre os supostos fatos delituosos e a determinação de afastamento da paciente de cargo público.

Outra importante alteração promovida pela Lei Anticrime no tema da prisão preventiva foi a inclusão da necessária revisão periódica dos motivos ensejadores da segregação cautelar a cada 90 (noventa) dias, com a inclusão do parágrafo único no art. 316 do CPP.

Sobre a exigência de revisão periódica o Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento em Plenário no sentido de que o decurso do prazo de 90 (noventa) dias não conduziria à soltura automática do preso preventivamente. Neste sentido foi o julgamento do Habeas Corpus n. 190028[4], de relatoria da Ministra Rosa Weber.

Neste sentido, destaca-se o julgamento, em Plenário do STF, do Habeas Corpus n. 191836[5], quando da suspensão da liminar que determinou a soltura de André Rap, entendendo que a inobservância do prazo de 90 (noventa) dias para revisão da prisão preventiva não a revoga automaticamente.


[1] Mestre em Ciências Jurídico-Criminais pela Universidade de Coimbra. Professora de Direito Penal. Advogada Criminal.

[2] Acadêmica do Curso de Direito na UFPR.


[3] STJ, HC 553310/SP, Relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, publicado em 17/11/2020.

[4] STF, HC 190028/SP, Relatora Ministra Rosa Weber, Primeira Turma, julgamento: 21/12/2020, publicação em 11/02/2021.

[5] STF, HC 191.826/SP, Relator Ministro Marco Aurelio, Relator para Acórdão Alexandre Moraes, Primeira Turma, julgamento em 20/11/2020.


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