Por: Lara Miranda Caloy1

Resumo: O estudo aborda a hodierna realidade, em que o direito penal econômico resvala em muitas searas da vida populacional. Nesse diapasão, o crime de insider trading corrobora esse cenário, haja vista, estar sendo muito debatido pelos tribunais e pela doutrina, a fim de sedimentar um entendimento que assegure certa estabilidade para a prática da legislação a pouco vigente. Assim, é primordial o estudo aprofundado desta temática, bem como entender os impactos deste crime para a sociedade, com vistas a garantir a seguridade e a liberdade.

1.     Introdução

A presente pesquisa é fruto de um estudo aprofundado sobre o crime de Insider trading muito em voga atualmente, mas que, conforme explicita o caso concreto, ainda não possui delimitações jurisprudenciais e doutrinárias suficientes para estabelecer sua base procedimental. Balizado a isso, precípua discorrer sobre o direito penal econômico em seu sentido amplo e analisar o crime outrora mencionado partindo da realidade.

Nesse diapasão, o problema objeto da pesquisa é: quais os impactos do crime de Insider Trading para o mercado de capitais atual? Sendo assim, o objetivo geral do trabalho é analisar a discussão que envolve o tema, por meio de casos concretos muito atuais e verificar a incidência desta prática e, por conseguinte, seus desdobramentos. Ademais, como objetivos específicos é possível mencionar, verificar o impacto do crime de insider trading no mercado de capitais, analisar o caso concreto e como os tribunais têm se debruçado na temática e observar as tendências doutrinárias basilares da prática.

No que tange a metodologia de pesquisa, o estudo que se propõe pertence à vertente metodológica jurídico-sociológica. No tocante ao tipo de investigação, foi escolhido, na classificação de Witker (1985) e Gustin (2010), o tipo jurídico-projetivo. O raciocínio desenvolvido na pesquisa será predominantemente dedutivo. Quanto à natureza dos dados, o estudo se baseia em dados secundários. De acordo com a técnica de análise de conteúdo, afirma-se que se trata de uma pesquisa teórica.

2.     Noções gerais do Direito Penal Econômico

Direito Penal econômico passa a ser visto como um ramo do Direito Penal geral que, com relativa autonomia, estuda, regula e aplica os dispositivos legais aos delitos praticados contra a ordem econômica (CIPRIANI, 2006, p. 438).

Primeiramente, antes de adentrar na temática ora em análise, insta salientar no que consiste o direito penal econômico hodiernamente. Nesse diapasão, como bem discorre Cipriani, tal ramo tornou-se independente e, por consequência, passou a ter maior aplicação prática, principalmente pelo desenvolvimento da ordem econômica.

É cediço que as relações comerciais têm se desenvolvido de forma exponencial, principalmente com as facilidades advindas da era tecnológica. À exemplo, investir na bolsa de valores tem se tornado muito mais prático e rápido através dos meios digitais e das possibilidades de se aprender com tutoriais online de como realizá-las.

Todavia, tal facilidade também impacta o direito penal econômico, haja vista, com o crescimento desta seara, as tendências de incorrência em crimes contra o mercado de capitais cresceram. Nesse âmago, urge que a população tenha o devido conhecimento sobre os efeitos desta prática ao adentrar nessa seara. Conforme bem adverte André Luiz Callegari:

 

[…] os efeitos característicos da criminalidade econômica são o da ressaca ou espiral, cuja descrição é a seguinte: num mercado de forte concorrência, a deslealdade se produz quando se esgotam as possibilidades legais de luta. Nesta situação, quem primeiro delinque acaba pressionando o resto à comissão de novos fatos delitivos (efeito de ressaca), e cada participante se converte assim no centro de uma nova ressaca (efeito de espiral). Este efeito de especial contágio se encontra facilitado porque o autor potencial é consciente do número enorme de delitos econômicos, da importância da cifra negra e da benignidade das penas previstas nas leis, suscitando uma imagem amável e positiva do criminoso (CALLEGARI, 2003, p. 25)

 

3.     Insider Trading

Este crime se caracteriza pela utilização de informações relevantes de que o autor tenha conhecimento. Mas ainda não foi divulgada no mercado e, aqui, é possível perceber o caráter sigiloso – elemento basilar do tipo. Além disso, é preciso que tal informação seja capaz de propiciar, para ele ou para outrem, vantagem indevida, mediante negociação.

Desta feita, é possível destacar quais são os elementos caracterizadores do crime e quem pode incorre-lo. No que tange ao primeiro, são três, a existência de informação privilegiada e não divulgada, ela pode ser veiculada por qualquer pessoa e ela precisa trazer efetiva utilização em negociações de valores mobiliários, para que se possa caracterizar a vantagem indevida. Já no que concerne ao segundo, resta claro que o crime pode ser cometido por qualquer um que tenha acesso a informação sigilosa, à título de exemplo, sócios, administradores, conselheiros, diretores, membros integrantes de órgãos técnicos e consultivos, membros do conselho fiscal, dentre outros.

Nesse ínterim, após a breve análise do tipo, é válido analisar um caso concreto em que tal prática foi identificada e como os tribunais têm se sedimentado diante de tal prática. Porém, antes disso, é mister observar que a doutrina e jurisprudência ainda não consolidou entendimentos que possam apaziguar o assunto, haja vista, haver alterações legislativas muito recentes na seara e casos eminentemente diferentes a serem tratados pontualmente.

PENAL E PROCESSUAL. CRIME CONTRA O MERCADO DE CAPITAIS. ART. 27-D DA LEI N. 6.385/1976. USO INDEVIDO           DE      INFORMAÇÃO PRIVILEGIADA – INSIDER TRADING. ALEGAÇÃO DE ATIPICIDADE DA CONDUTA. NÃO ACOLHIMENTO. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE. AUMENTO.          CULPABILIDADE

EXACERBADA. FUNDAMENTO IDÔNEO. PENA DE MULTA. APLICAÇÃO CORRETA. DANOS MORAIS. NÃO CABIMENTO. CRIME COMETIDO ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI                     N.              11.719/2008. IRRETROATIVIDADE.

[…]

  1. A responsabilidade penal pelo uso indevido de informação privilegiada, ou seja, o chamado Insider Trading – expressão originária do ordenamento jurídico norte- americano – ocorreu com o advento da Lei n. 303/2001, que acrescentou o artigo 27-D à Lei n. 6.385/76, não existindo, ainda, no Brasil, um posicionamento jurisprudencial pacífico acerca da conduta descrita no aludido

 

 

dispositivo, tampouco consenso doutrinário a respeito do tema.

  1. A teor do disposto nos arts. 3º e 6º da Instrução Normativa 358/2002 da Comissão de Valores Mobiliários e no art. 157, § 4º, da Lei n. 6.404/1976, quando o insider detiver informações relevantes sobre sua companhia deverá comunicá-las ao mercado de capitais tão logo seja possível, ou, no caso em que não puder fazê-lo, por entender que sua revelação colocará em risco interesses da empresa, deverá abster-se de negociar com os valores mobiliários referentes às informações privilegiadas, enquanto não forem divulgadas. […]
  2. No caso concreto, não há controvérsia quanto às datas em que as operações ocorreram e nem quanto ao fato de que o acusado participou das discussões e tratativas visando à elaboração da oferta pública de aquisição de ações da Perdigão S.A, obtendo, no ano de 2006, informações confidenciais de sua companhia – Sadia S.A. – as quais, no exercício de sua profissão, tinha o dever de manter em sigilo […]
  3. O cargo exercido pelo recorrente na época dos fatos – Diretor de Finanças e Relações com Investidores da Sadia S.A. – constitui fundamento idôneo para justificar o aumento da pena-base, “diante da sua posição de destaque na empresa e de liderança no processo de tentativa de aquisição da Perdigão”, conforme destacou o acórdão recorrido.

[…] (REsp 1569171/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, QUINTA TURMA,

julgado em 16/02/2016, DJe 25/02/2016)

 

Diante da análise do julgado ora exposto, resta claro que se trata de um caso envolvendo a Perdigão e a Sadia e como bem explicitado no excerto ainda não há um posicionamento cediço. Porém, diante do cargo de destaque do profissional da Sadia – Diretor de Finanças e Relações com Investidores – e da situação que o envolveu, restou eminente que ele possuía informações privilegiadas e da forma como foi exposto, incorreu na prática do Insider Trading.

 

4.     Conclusão

Mesmo as mais poderosas pressões só serão levadas em conta e elaboradas juridicamente a partir da forma como aparecem nas ‘telas’ internas, onde se projeta as construções jurídicas da realidade. Nesse sentido, as grandes evoluções sociais ‘modulam’ a evolução do Direito, que, não obstante, segue uma lógica própria de desenvolvimento. (TEUBNER, 1983, p. 249.)

A presente pesquisa ainda se encontra em estágio inicial. Desse modo, como conclusões parciais, é possível verificar que a dinâmica do insider trading está tomando forma de acordo com os casos práticos que são submetidos aos tribunais e a partir disso, a doutrina está realizando análises capazes de sedimentar a teoria com base na prática.

No entanto, é fato que tal crime está tendo fortes consequências na vida do corpo social e assim, é de suma importância que estes tomem os devidos conhecimentos do tipo e das bases que estão sendo lapidadas. Balizado a isto, também é imperial que o Direito se desenvolva e reflita as mudanças sociais, pois, conforme explicita Teubner, o ramo jurídico é fruto das relações humanas e fim para respaldá-las.

 


1 Graduanda em Direito pela Universidade Federal de Juiz de Fora – email: laracaloy@hotmail.com


5.     Referências Bibliográficas

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 1569171/SP. PENAL E PROCESSUAL. CRIME CONTRA O MERCADO DE CAPITAIS. ART. 27-D DA LEI N. 6.385/1976. USO INDEVIDO DE INFORMAÇÃO PRIVILEGIADA – INSIDER TRADING. ALEGAÇÃO DE ATIPICIDADE DA CONDUTA. NÃO ACOLHIMENTO. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE. AUMENTO. CULPABILIDADE EXACERBADA. FUNDAMENTO IDÔNEO. PENA DE MULTA. APLICAÇÃO CORRETA. DANOS MORAIS. NÃO CABIMENTO. CRIME COMETIDO ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI N. 11.719/2008. IRRETROATIVIDADE. Ministro

Gurgel de Faria. 16 fev. 2016.

CALLEGARI, André Luís. Direito penal econômico e lavagem de dinheiro: aspectos criminológicos. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003.

CIPRIANI, Mário Luís Lírio. Direito penal econômico e legitimação da intervenção estatal – Algumas linhas para a legitimação ou não-intervenção penal no domínio econômico à luz da função da pena e da política criminal. In: D’ÁVILA, Fábio Roberto; SOUZA, Paulo Vinícius Sporleder (Coord.). Direito penal secundário: estudos sobre crimes econômicos, ambientais, informáticos e outras questões. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.

GUSTIN, Miracy Barbosa de Sousa; DIAS, Maria Tereza Fonseca. (Re)pensando a pesquisa jurídica: teoria e prática. 3ª. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2010.

TEUBNER, Gunther. O Direito como Sistema Autopoiético. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1989.

WITKER, Jorge. Cómo elaborar una tesis en derecho: pautas metodológicas y técnicas para el estudiante o investigador del derecho. Madrid: Civitas, 1985.


Este artigo reflete a opinião de seus autores e não necessariamente a opinião do IBDPE.
Este espaço é aberto aos Associados do IBDPE! Para submeter seu artigo, envie uma mensagem para contato@ibdpe.com